domingo, 29 de junho de 2008

Como a Menor das Criaturas consegue falar do Reino de Deus

A História da Conversão de uma Alma (Minha Alma)

Chegou a hora...

Esta é a história real de uma alma que encontrou enfim o aconchego da verdade absoluta. Pode alguém desejar pensar – é ínsito ao ser humano pensar - que é somente mais uma entre tantas histórias de tantos outros seres humanos que encontram o seio materno da Igreja Cristo. Eu até concordaria se a história que narro não fosse a história da minha vida, que possivelmente não representaria muito para tantos que pudessem ler tão emocionadas linhas, mas no entanto é minha vida, e ela significa muito pra mim, e significou além das medidas humanas para um jovem homem que se auto-intitula “a menor das criaturas”. Foi essa criatura "tão pequena" que tornou possível o preenchimento d0 infinito espaço de minha alma pela certeza do amor incontestável da Igreja de Cristo.

Meu nome é Maria Evora, tenho 45 anos, sou viúva de um excelente marido e tenho três filhos. Nasci em um lar protestante tradicional, sempre vivi tal ambiente. Nele que recebi toda a minha formação luterana tradicional juntamente com a educação formal. Estudei filosofia e os escritos reformados; também durante vinte anos mantenho o estudo da astronomia como uma ocupação diária. A razão sempre foi pra mim o único sinônimo de obtenção da verdade. Tudo que estudo e faço não se dá fora da persuasão e da investigação dos fatos que tornam claras as evidências do conhecimento cieintífico. No lar familiar que cresci como cristã, todos nós éramos praticantes fidelíssimos das orações, embora estivessem sempre acompanhadas de ferozes críticas aos católicos. Não era difícil em meio a orações que julgávamos ser corretas, manifestarmos palavras como:

“Senhor, convertei os católicos idólatras, tirai-os do Papa”; ou ainda,

“Pai, como são eles pecadores e tão perdidos no papismo”.

Quando me casei, foi meu desejo junto do meu falecido esposo tornar nosso lar um lar estritamente arraigado no protestantismo. Educando nossos filhos da prática dos ensinos reformados teríamos uma vida tranquila, sem complicações. Construí minha vida sendo inimiga declarada da Igreja Romana. Estudei com afinco os ensinamentos de Erasmo de Roterdão, João Wesley e João Calvino, logrando neles a pura razão. Estava sempre pronta para o debate, no entanto, a mesma razão que eu sempre julguei ter, era terminantemente perdida quando argumentava com um católico romano:

“Você não tem conhecimento”- dizia sempre com dureza.

“Sua Igreja é uma mancha na história, e somos nós protestantes os libertadores poder profano dos Papas”.

Que razão eu teria em tais argumentos? Certamente na época todos eram muito convincentes ao meu egoísmo, ao ponto de serem verdadeiros vendas que me impediam de olhar com profundidade para outros realidades. Usando dos conceitos por mim previamente elaborados, tinha-me sempre por vencedora, mesmo na verdade sendo a perdedora mais eficaz que o protestantismo já teve. Ninguém se daria a conversar com alguém que perdesse de início qualquer capacidade argumentativa e usava de ironias e agressividades para o que eu julgava ser um diálogo.

A fórmula que resumia minha fé – e toda minha agressividade contra os católicos – estava contida na manifestação de Lutero diante do Imperador Carlos V e dos príncipes da Alemanha, quando prestou contas de seu ensino reformado:

“Já que me pede uma resposta, darei uma que não deixa margem de dúvidas. A não ser que alguém me convença pelo testemunho da Escritura Sagrada ou com razões decisivas, não posso retratar-me. Pois não creio nem na infalibilidade do Papa, nem da dos Concílios”.

Como me soava certa tal manifestação do reformador diante dos reis e príncipes. Lutero não dividiu somente o cristianismo, mas dividiu a Europa. Tudo que a Igreja Católica tinha mantido firme com a queda do Império Romano, o frei agostiniano tentou destruir com sua pretensiosa e malfada Odisséia.

De um fato eu estava certa, e era exatamente ter a convicção de querer estar no caminho da verdade, não me furtando do direito de sempre buscar as respostas que nenhuma filosofia moderna poderia me dar. Estava feliz no meu protestantismo, pois nem a Igreja que existia durante dois mil anos era capaz de me convencer do contrário. Certamente o Cardeal Newmann estaria dando gargalhadas de mim.le mesmo um opositor do catolicismo dos mais eficientes, e acabou - depois de desejar provar que a Igreja Católica não era a Igreja de Cristo - afirmando que tal Igreja jamais errou, rendendo-se aos sacramentos de Roma e eleito Cardeal.

Qualquer momento para mim era propício ao ataque; se me falavam de sacramentos, eu tinha na ponta da língua a Confissão Luterana de Augsburgo; se alguém tivesse o atrevimento de discorrer sobre a Bíblia, ligeiramente eu me municiava das traduções luteranas dos Textos Sagrados; se algum mestre ensinava sobre a sucessão dos apóstolos, tão naturalmente eu reagia com o falso axioma protestante da Igreja presente em todos os lugares – ainda que não admitisse sob nenhuma hipótese que se a Igreja de Cristo estava em todos os lugares, logicamente também estaria na Igreja Católica. Meu ego me afogava em profunda cegueira. Era feliz em minha vida construída sobre as mais movediças das areias, e não sabia que minha mansão iria ruir apesar do meu convencimento de que o protestantismo era em si a essência única do cristianismo.

Estudava horas os escritos protestantes, dedicando-me especialmente às Confissões Reformadas: Augsburgo, Belga, Escocesa, Westminster, Gaulesa, New Hampshire, Saxônica, Tetrapolitana e Wurtemberg. Todas elas eram claras – mesmo que obscuras – quanto ao que eu mais desejava: derrotar o Papado e os Bispos Católicos; fazer ruir os pilares de Roma, como se isso fosse possível!

Apesar de feliz em meu palacete de argumentos, sempre me incomodei com um fato inexoravelmente intrigante, na indagação – que era mais uma ferida aberta e escondida de todos - de que um fiel do protestantismo e de todas as suas ramificações – pois temos que admitir que o protestantismo já nasceu divido com Martinho Lutero, Ulrich Zwinglio e Felipe Melanchton – era mais um objeto de posse dos pastores, mestres e doutores em protestantismo do que um membro efetivo do corpo que eles julgavam ser igreja. Somos muito mais uma fonte de números e valores do que fiéis em sentido estrito, ou seja, pessoas que aderem aos ensinamentos de Lutero e demais reformadores pelo fato de realmente crermos no que eles ensinaram. Não importa a fé, o que é necessário e quantos mais puderem se opor ao poder dos Papas. Infindáveis discussões foram travadas com mestres e doutores em protestantismo. Eu meconsiderava mais uma entre tantos outros e que nos faltava uma mística profunda, que nos tornassem ainda mais virtuosos, invés de nos julgarmos santos já em vida. Esse pensamento sempre justificou atitudes extremamente controvertidas de nossos mestres, ao ponto que tornava legítimo ainda mais o poder profano de desejar possuir números e cifras e não fiéis verdadeiros.

Entre minhas intrigas mais atrozes, estava também uma questão se que se apresentava extremamente complexa: - “Sendo o protestantismo já divido já no seu nascimento, se o cristianismo pedisse socorro à unidade, seríamos nós protestantes ramificados em infinitas denominações, o meio eficaz de manter a unidade? Se um colapso cultural e jurídico como foi a invasão dos Bárbaros no século IV novamente ocorresse, toda a nossa filosofia e teologia seria suficiente para manter nossos modos de vida? Supondo que a humanidade clamasse por auxílio ao protestantismo não seríamos nós muito mais um grande grupo de denominações controversas entre si, que possibilitam acusações mútuas para engrossar cada qual suas fileiras, do que de fato prestar auxílio ao ser humano perdido, especialmente por eventos históricos que não poderemos evitar? - Estava aí o meu calcanhar de Aquiles e nunca pude imaginar que alguém seria capaz de decifrar em mim esse código. Qualquer momento que fosse possível que eu questionasse a minha fé radicalmente protestante, em razão dessa falha estrutural tanto do protestantismo quanto dos protestantes – quanto de mim - lembrava-me da Igreja Católica tão profana e herética, da ousadia e coragem de Lutero e dos reformadores, e tudo voltava ao normal. Meu palacete construído em areia ainda não tinha sofrido os efeitos da ventania, até o dia que conheci “a menor das criaturas”.

Entre meus mais admirados versados na doutrina luterana, estava um senhor de nome João Vital, morador de Lisboa e grande conhecedor das Sagradas Escrituras. Homem dado ao debate, sempre me outorgava sua presença e paciência. Perguntei-lhe certa vez:

- Somos tantos espalhados em infinitas denominações, então se a unidade do mundo dependesse de nós, o que teríamos a oferecer?

Ele respondeu:

- Maria, essa não é nossa razão de existir, temos que manter a tradição protestante, isso nos basta! Se somos aqueles que desde a reforma protestante são os opositores do Papado, devemos permanecer fiéis ao que nos é dado como regra. As intenções de Lutero foram sinceras; não podem ser perdidas por causa de nossas dúvidas pessoais.

Repliquei:

- Mas é Cristo que pede a unidade? Então, se três dias após Lutero romper com as estruturas canônicas de Roma já estavam discutindo Zwinglio e Melanchton sobre suas visões diferentes de Lutero e querendo dividir a Europa, isso significa que não há unidade em nós!

A resposta foi fria e sem sentido:

- Lutero desejou apenas reformar a doutrina cristã, negando o poder dos Papas. É isso que devemos saber e seguir. Qualquer outra forma de pensamento não condiz com o que professamos, assim se tivermos que dividir para conquistar ainda mais, que exista pois a divisão em nome do Evangelho e do luteranismo!

Sei que nunca poderia colocar em linhas minha decepção. Tive a sensação de ser um mero objeto de um conflito de interesses que teria fim somente na grande consumação dos tempos. De um lado estava uma Igreja que admitidamente sobrevivia após dois mil anos, e de outro uma doutrina com apenas quinhentos anos de caminhada. Se sopesássemos as duas numa justa medida, não nos sobraria mais nada do que lamentar por mil e quinhentos anos que nunca existimos. Sentia calafrios ao cogitar a possibilidade de que no fim perderíamos tudo, porque Roma se erguia imponente enquanto nós estávamos dispersos sem qualquer unidade. Os católicos tinham contra mim um argumento infalível: eram os mesmos em doutrina e na fé desde os primórdios apostólicos.

Foi pelo protestantismo que conheci toda a Europa e o Brasil. Era participante assídua dos eventos protestantes e principalmente uma de suas entusiastas: - “preciso levar a verdade mesmo com dúvidas concretas e incômodas sendo partes de meu existir”. Calhou-me uma viagem ao Brasil, para visitar amigos em São Paulo, Valinhos e Campinas, cidades promissoras onde mantínhamos círculos de ensinamentos protestantes e educação bíblica. Era prazeroso assim fazer pelos menos uma vez ao ano. Viajava feliz de Portugal ao Brasil para ajudar a criar novos combatentes do protestantismo, e também outros tantos inimigos do Papa e da Igreja Católica. Soava como divertimento rir da ignorância dos católicos - e como me sentia bem e me acalmava os ânimos – ao ponto de decorrerem horas de sátiras tão cruéis. Qualquer um dos tantos que estivessem conosco se tornavam críticos do catolicismo, com argumentos muito mais difamantes da honra dos católicos do que edificantes ao protestantismo.

Era o mês de abril de 2007, estávamos em Valinhos quando se apresentou a possibilidade de viajarmos até o sul de Minas Gerais, onde teríamos meios de nos encontrarmos com eminentes estudiosos do protestantismo numa chácara na cidade de Passos. Desejava conhecer a fé luterana da região que deu ao protestantismo presbiteriano a pessoa de Rubem Alves, um professor tão notório quanto lido entre os que adotam sua linha mais progressista. Apesar de que nunca me senti tal, não podia negar o fato de que ele representava toda a fé reformada que eu tanto orgulhava possuir. Prontamente tomamos todas as medidas para irmos felizes conhecer nossos irmãos e nos deleitarmos em ensinamentos sobre o protestantismo e quem sabe criticarmos com mais rigor os católicos romanos. Não sabia que meu alçapão já estava me esperando com um dos meus pés já dentro dele.

Chegando na cidade, eis que conheci um templo presbiteriano bem no centro onde eu estava hospedada conjuntamente de outros amigos. O templo era estilo bem romano e se erguia entre outras construções de uma cidade muito bonita. Mesmo assim a expectativa para o encontro no final de semana era enorme e mal podia ter meios de arranjar momentos para passar o tempo que era severo em não me beneficiar com a velocidade. Totalmente inquieta e ansiosa ao ponto de transpirar pelas mãos, eis que uma de minhas companheiras de nome Graciela me fez um convite para o próximo dia – que seria um lindo sábado ensolarado; um dia em que grande sinal da luz em que em mim já estava raiando nasceria, uma nova aurora já dava sinais de alvorecer – de ir até uma palestra que seria realizado por seu curso universitário de ciências jurídicas. Não me interessei e me sentia perdida diante da ansiedade, mas confesso que considerava cansativo ouvir uma palestra de um ramo do conhecimento que eu não dominava, afinal eu era protestante e só a religião tinha toda a minha adesão de consciência e de estudo, ao lado de minha amada astronomia. Para minha surpresa, a senhorita que me acompanhava – tão ou mais protestante que eu – me disse: - “vamos, irá gostar! Será uma aula sobre direitos humanos e religião”. Soou-me de repente um pouco mais interessante, pois o que poderia ter dos mestres do protestantismo como Wesley, Lutero, Calvino, Zwinglio e Melanchton na história dos direitos humanos? Aceitei o convite.

Na linda manhã de sábado o sol se fez presente. Acordei com um pensamento latejante na cabeça: - “quisera entender melhor o protestantismo para enfim dar a ele os contornos que tanto falta em sua doutrina, assim, nós, seus professos, não iremos nos sentir apenas um número dos interesses da igreja”. Aquele remoer cognitivo já era a semente do que cerca de horas depois seria o mudança mais radical que uma mulher nos seus quarenta e três anos de vida – à época - já havia experimentado. O centro de eventos era próximo, tanto que caminhamos três quadras até chegar ao local. Lá vi alunos da universidade estadual chegando para a aula, que apesar de ser realizada pela academia, estava aberta ao público em geral. Adentramos pelo centro de eventos e um grande número de pessoas se fazia presente. Muitos com seus cadernos e livros, outros de terno a rigor, enquanto outros não tão bem postados. Quando é anunciado o palestrante, o meu inconsciente esperava um senhor já gasto pelos anos e com o vocabulário de um ancião - foi esse o meu primeiro engano dia, e outro maior ainda me aguardava. Sobe um jovem no plenário, estava muito bem vestido de terno preto, uma linda camisa branca e uma gravata muito bem disposta - ao estilo de um europeu muito fino. Imediatamente associei aquela figura aos jovens estudiosos de nossa doutrina. O rosto era de uma criança, mas transparecia segurança - o que me entusiasmou – seria ele um grande pastor protestante, especialmente daqueles caráteres que arrebatam toda uma assembléia de fiéis com seus discursos e pregações fundamentados na Sola Scriptura Luterana?

De tal forma projetei tal imagem que me senti logo identificada com sua pessoa, no entanto, sofro o meu segundo engano do dia. Ao lado de minha companheira digo:

“Agora sei porque me convidou! Porque esse jovem é um grande orador de nossa fé. Estou feliz por estar aqui”.

Mas a negativa foi cortante:

“Não Maria! Ele é católico, e não é daqueles que vão à missa uma vez ao ano. Alguns dizem que ele é conservador, mas eu acho que não, porque nunca ouvi ele agredir o protestantismo.. Apesar de nunca ter conhecido sua vida”.

Não consegui esconder a decepção. Tive que me recompor em pouquíssimo tempo em razão de ser aberta a aula e o silêncio reinar no plenário. Desejava sair pela porta mais próxima, o que foi impossível porque certamente iria sozinha. O jovem professor se apresentou com o nome de Carlos Eduardo – tinha uma voz firme e vibrante – e começou a proferir os ensinamentos. Discorreu sobre os escolásticos, especialmente sobre São Tomás de Aquino. Citou São Boaventura para falar da beleza do ser humano como um ser criado para as realidades supremas, e que deste pensamento foi construída toda a fundamentação dos direitos humanos.


Ouvi:


“Todo homem tem direitos humanos não só em razão de ter condição humana. Se pensássemos assim, estaríamos retirando a humanidade uma condição importantíssima de sua natureza, que é um ser que possui moral. Se cada ser humano fosse somente um corpo, e pior, sem moral, não poderíamos falar de valores supremos. Os direitos humanos são o que são porque estão dispostos pela razão da moral. O homem e a mulher possuem direitos humanos pelo fato de possuírem a marca definitiva da moral impressa em suas consciências, ou como melhor definiria, em suas almas. Imprimir na alma a moral é fruto de um ser supremo, dessa forma, cada ser humano detém uma condição de realeza sobre as demais criaturas”.



Continuou:

“Os escolásticos, especialmente Tomás de Aquino, deram o salto que nenhum filósofo grego tinha conseguido dar. A democracia grega tinha se mostrado impotente de resolver conflitos da intimidade, pois era eficaz somente no coletivo das decisões tomadas e dos discursos da Ágora Ateniense. A moral não destrói a natureza humana, porém a qualifica, a capacita, a torna apta para o reconhecimento do ser humano como um ser que possui moral, e deve viver no reconhecimento da moral própria e da moral do próximo, logo, moral universal, porque a moral não é mutável de acordo com o tempo e aos critérios individuais de cada pessoa; ela é perene e se aplica igualmente aos seres humanos indistintamente”.

O espanto era enorme, pois como poderia em plena Idade Média – tão obscura pelo catolicismo – ser possível a presença de elementos tão fortes em benefício do ser humano? Foi exatamente contra isso que Martinho Lutero havia lutado, ou seja, para libertar o povo da opressão dos Papas! Engano meu!

Quanto mais ouvia dizer sobre realeza do ser humano e como aqueles homens que eram filósofos – e para meu desgosto, também santos da Igreja opressora – ensinavam sobre a verdadeira beleza que é fruto da Beleza Incriada e como o pensamento humano tem a tendência para a perfeição, mais eu me sentia agredida em minha fé.

Impregnado da certeza impressionante, com firmeza de olhar, o professor continuava com o ensino. Afirmou que a Igreja Católica foi a primeira instituição no mundo a se opor contra a escravidão, tanto que no século XVII o Papa Bento XIV punia com pena de excomunhão qualquer católico que oprimisse a liberdade de uma criatura de Deus. O iluminismo não havia sido a luz do mundo, mas a Igreja Católica.

Ensinou que os católicos quando vitimados pela decadência dos povos bárbaros, foram eles que sustentaram toda a cultura clássica, principalmente os ensinos dos padres apostólicos e a utilização dos métodos do “Trivium”, construindo o conhecimento através da retórica, da lógica e da gramática; e do “Quadrivium” com a aritmética, a geometria, a música e a astronomia. Uma lança me traspassou a alma porque tinha quase como que um ofício o estudo da astronomia, um conhecimento que era tão íntimo de mim quanto o protestantismo. As dúvidas cresceram! Não estaria aquele jovem homem a decifrar em mim o que até hoje nenhum mestre protestante e nem eu mesma havia conseguido? Um buraco em mim estava sendo preenchido pelo uso da razão. Aqueles argumentos eram extremamente convincentes mesmo que para o mais feroz dos defensores de Lutero.

“As universidades são criações da Igreja Católica, e foram nelas que os escolásticos, com a investigação acadêmica, edificaram o conceito de Estado Civil e dignidade humana”, dizia com certeza absoluta.

O que somos hoje, enquanto detentores do conhecimento foram eles que possibilitaram ao homem os meios de produzir a investigação científica. A ordem beneditina trouxe até nós as bibliotecas, os dominicanos abriram as portas para o que é o ser humano e sua alma. Foi da religião que nasceu os direitos humanos, pois ela é a única instância com suficiência moral para criar, gerir e administrar o que é peculiar da humanidade.

Lutero estava errado? A Igreja não teria sido o mal a ser batido? Eu não podia acreditar, mas aquilo tomou sentidos profundos em mim. Para meu espanto não queria mais sair correndo, mas ouvir sobre o assunto com afinco, e quando percebi, aquele jovem tinha toda a minha atenção em caráter exclusivo. A unidade que nós protestantes nunca tivemos ou possuímos estava na Igreja Católica?

Por que eu não aprendi isso? Qual foi o livro que eu não li e que me faltou nos meus conhecimentos? Seria então verdade que a Suma Teológica era verdadeiramente – como disse o professor – “um tratado sobre a dignidade do ser humano”? Será que como ensina São Boaventura eu teria ficado perdida pelo caminho ao não permitir que meu conhecimento tendesse para o eterno? Será que eu não me concentrei demais somente nos mestres protestantes e me esqueci de outros letrados da história que mostram que a Igreja Católica na verdade construiu todo o ocidente? Não teriam sido os reformadores muito mais sonhadores do que construtores de uma doutrina? Dúvidas tão doloridas estavam sendo respondidas por alguém que nunca tinha conhecido, e pior ainda, por um católico papista!

Meu Senhor, a Igreja Católica é a unidade! Ela até permitiu que Lutero pudesse ler e traduzir a Bílbia. Foi ela que ensinou os métodos de investigação que alguns filhos maldosos usaram contra ela própria. Esta é a Igreja que com seu Concílio de Trento afirmou a supremacia dos Sacramentos; que trouxe ao protestantismo – seu opositor histórico – a possibilidade dele mesmo se auto-proclamar cheio de dignidade mesmo que contra Ela. Mesmo separado de Roma o que teria sido Lutero sem ela? Minha vontade era estar diante dos reformadores e dizer: “Vocês difamam e se separam daquele que é Mãe! Se sabem ler e redigir suas Confissões de Fé é porque a Igreja lhes ensinou ler e escrever. Mesmo cada um de vocês se separando dela, ainda assim Ela sustenta suas vidas”.

Não podia admitir outra coisa, não teria outro pensamento, que não fosse a certeza de que o protestantismo estava sendo desconstruído com muita elegância diante de mim. Aquele momento tão dolorido e celestial revelou a luz aos meus olhos escamados, a luz de uma Igreja se revelava por um jovem vinte anos mais novo do que eu. Foi a mais sublime aula sobre filosofia que havia presenciado em minha vida, mesmo que com teores de uma ciência jurídica que nunca dominei. O Senhor me conduziu para aquele momento por pura misericórdia, sabendo que só poderia existir um homem – jovem – que seria capaz de exaurir em mim tão cruéis questões.

Terminada a aula, a única vontade que me dominava era poder conversar com aquele professor. Um grupo de alunos o cercou com perguntas e conversas cheias de risos, alegria, ensinamentos. Quase que me humilhando pedi para minha companheira que me aguardasse, porque era questão de vida ou morte falar com aquele doutrinador. Quando finalmente aqueles alunos se retiraram, com o sotaque tão marcante de uma portuguesa, disse: “- Jovem professor, foi uma bela aula!” Com um sorriso inesquecível, cheio de gentileza ouço: - “Que bom que gostou, não é todo dia que temos uma presença internacional em nosso meio!”

Com acanhamento disse: - O senhor poderia dar algumas respostas para uma protestante que até pouco tempo atrás entrou por aquela porta convicta do protestantismo, e pela mesma porta se retira não sendo a mesma pessoa?

- Que católico eu seria se não atendesse um pedido como esse?

- Eu peço que me diga sobre alguma literatura que pudesse fundamentar que a Igreja Católica é Católica desde Cristo!

Cheio de conhecimento de causa, com a mesma voz firme e olhar centrado, eis que ele me perguntou:

- Não conhece a tradição apostólica?

- Não! O único estudo que fiz se concentrou do século XVI até os dias atuais! Estudei alguns textos como a Didaqué, a Epístola de Barnabé, o Pastor de Hermas. Vi algumas citações de Inácio de Antioquia e algo de Agostinho de Hipona.

- Então temos que sanar esse lapso de mais de mil e quinhentos anos!

Mil e quinhentos anos? Estava ali ouvindo tudo que eu temia; finalmente o grande desafio de contraditar um católico que usasse de quinze séculos de história contra o protestantismo se concretizava. Eu estava totalmente impotente, contra toda essa história eu não podia mover sequer um dedo.

- Existem evidências históricas de que a Igreja Católica não passou a se chamar Católica só no Concílio de Nicéia?

- Sim, Ela é católica desde Cristo.

- Mas isso é impossível, não existem relatos disso!

- Existem sim! O protestantismo usa a tradição apostólica somente no que interessa aos seus estudos. Quando elementos fundamentais da fé apostólica evidenciam a existência do episcopado dos apóstolos e a sucessão dos bispos, especialmente quando a nome “Igreja Católica” é relatado nos escritos apostólicos, simplesmente são retirados dos livros protestantes. Do contrário seria a ruína de uma reforma iniciada sem qualquer precedente na história.

A elegância com que ele discorria me deixava paralisada; eu não esboçava nenhuma reação que não fosse ouvir e perguntar. Ele estava me oferecendo o início de uma graça que ainda hoje eu não compreendo a magnitude.

- A senhora me disse que conhecia a Didaqué, a Epístola de Barnabé, Inácio de Antioquia e o Pastor de Hermas. Pois bem, conhecendo Inácio de Antioquia que viveu no século I, então, contemporâneo dos apóstolos, creio então que conheça a Epístola aos Esmirnenses e o Chronicon de Eusébio de Cesaréia.

- Não professor! Tenho conhecimento de que tais epístolas e escritos existem e que são consultadas por muitos estudiosos, mas nunca li qualquer linha sobre que não fosse citações esparsas.

- Quando surgir oportunidade leia cada um deles. Além, inclua em sua leitura os fragmentos do Cânon de Muratori. Em todos eles verá que a Igreja é Santa e Católica desde os apóstolos, e que eles jamais permitiram que seus sucessores tratassem a fé como sendo católica se eles mesmos não autorizassem. Não pode se esquecer de estudar os escritos de Irineu, onde ele traz a lista dos Papas. Com isso constatará a continuidade da fé apostólica nos Bispos como Inácio de Antioquia, Irineu de Lião, Policarpo de Esmirna e Eusébio de Cesaréia.

- Existindo então a tradição apostólica, por que os reformadores não a levaram em consideração em suas doutrinas? Fico a pensar sobre a possibilidade de não encontrar nenhum fragmento da tradição na história.

- Simplesmente porque se assim tivessem feito, o protestantismo jamais iria nascer. A tradição apostólica fundamenta o catolicismo e não o protestantismo. Seria contraditório para os reformadores pregarem evidências que contestavam suas pretensões. Inácio de Antioquia que foi sucessor apostólico no século I, pouco mais de 70 d.C, já escrevia que onde estiver o Bispo e Cristo, ali estará a Igreja Católica. Essa é a universalidade, pois se assim não fosse, o catolicismo não passaria de um grupo de judeus revoltosos escondidos numa casa, sendo que nessa casa ocorreu o Pentecostes, e desse marco se apresenta a grandeza da Igreja.

- Creio que posso aceitar que o termo “católica” da Igreja é usado desde o primeiro século, pois se existem tais evidências, certamente irei encontrar fontes tão preciosas de estudo. Mesmo assim existe um fato notório que implica no completo desabono dos Papas e do catolicismo. Não posso ligar ao século I uma Igreja Romana que adulterou os textos sagrados, inserindo no Cânon das Escrituras os livros deuterocanônicos no Concílio de Trento.

Por um momento a velha Maria estava de volta. Não conseguia oferecer nenhum argumento contrário, até que achei ao menos um, que para meu desgosto e futura alegria durou muito pouco. Por um breve momento acreditei que ali não existiria para ele escapatória. Mas a lógica elementar do “Trivium” Católico e a retórica que ele usava com tanta destreza, imediatamente como espada desembainhada foram usados contra mim.

- Esse é uma acusação do protestantismo que não encontra fundamentos. Já ouviu falar de Bíblia de Gutenberg?

- Nunca ouvi falar. Mas o que isso toca ao assunto sendo que na Bílbia não se encontra a autoridade do Concílio de Trento?

- Lutero é tido pelo protestantismo como o tradutor da Bíblia e por ter desmascarado a Igreja Católica que inseriu arbitrariamente os deuterocanônicos no Cânon Bíblico. A Bíblia de Gutenberg foi escrita no século XV, em 1450. Nela encontramos os deuterocanônicos, além de ser a tradução do latim para o alemão dos textos sagrados. O Concílio de Trento ocorreu no século XVI, tendo seu início em 1545, ou seja, 95 anos após a edição da Bíblia de Gutenberg. Como Trento poderia ter inserido os deuterocanônicos se já circulava a Bíblia de Gutenberg um século antes? Isso contraria qualquer lei de tempo e espaço e o senso lógico. Sugiro que consulte o texto de Gutenberg, verá que consta o deuterocanônicos assim como foram autorizados pela sucessão apostólica desde os séculos primeiros do cristianismo.

- Irei consultar com certeza, desejando ter a mesma certeza que o senhor encontrou e professa.

A conversa continuou por um tempo, em tom amistoso e de extrema cordialidade. Era um momento que nunca que vivido. Sempre oferecia oposição ao catolicismo e aos católicos; algo diferente acontecia em mim, inegavelmente um pedaço de mim mesma havia morrido naquela aula.

Tomei a precaução de pedir todos os meios possíveis de contato com tão diferenciado católico. Ele dominava conceitos históricos e quando falava qualquer um se sentiria intimidado com tamanha desenvoltura. O encontro daquela semana com meus amigos protestantes foi totalmente sem sentido. Passamos dias bons juntos, mas só aquela figura humana era permanente em minha mente: - E se ele estivesse certo? Então Lutero e os reformadores, especialmente suas afrontas ao papado e aos concílios, teriam sido um atos impensados, muito mais constituídos de revolta do que de razão!” Tinha que correr esse risco, não me dava o direito de fugir das respostas por mais que elas me causassem dor.

Passados oito dias daquela conversa, eis que retorno a Lisboa cheia de curiosidade e com um temor avassalador dentro do peito. Será que ele está certo? Não existia outra forma de constatar se era um mentiroso ou um louco! Era necessário ir buscar a água mesmo que suja para dela beber um copo, ou dois, ou tantos outros. Fui correndo para a Biblioteca Nacional de Lisboa. Pedi alguns livros que constassem as fontes sugeridas e é claro a própria Bíblia de Gutenberg. Foi longa a espera até que a bibliotecária depositou sobre a escrivaninha oito livros; entre eles uma edição da Bíblia de Gutenberg. Fiz uma oração silenciosa, clamei ao Bom Deus que se fosse da vontade dele eu pudesse ali encontrar as respostas para minhas dúvidas. Propositadamente deixei a Bíblia por último, pois se eu não encontrasse o termo “Igreja Católica” e a lista dos Papas eu não me daria o labor de verificar sequer os textos sagrados de Gutenberg.

Quando abri a Epístola aos Esmirnenses fui tomada de um pânico sem igual. Ela que foi escrita no século I, junto dos apóstolos, Inácio da Antioquia cravava na história: “Onde comparecer o Bispo, aí esteja a multidão, do mesmo modo que, onde estiver Jesus Cristo, aí está a Igreja Católica”. O Cânon de Muratori decretava: “[os livros apócrifos] não podem ser recebidos na Igreja Católica”. Policarpo de Esmirna quando foi martirizado - ele próprio discípulo do Apóstolo João - com seu ato de bravura por Cristo comoveu os cristãos que a tal ponto que o povo do episcopado de Esmirna - onde São Policarpo foi Bispo - escreveu para os povos cristãos de outros bispados: “A Igreja de Deus que peregrina em Esmirna à Igreja de Deus que peregrina em Filomélio e a todas as paróquias da Igreja Santa e Católica em todo o mundo”. Com esse endereçamento, enviam para a Igreja Católica em todo o mundo a oração que Policarpo fez antes de ser martirizado: “Ó Senhor, Deus Todo-Poderoso, Pai de Jesus Cristo, Teu Filho Bem-Amado e bendito, por Quem nós Te conhecemos; Deus dos Anjos e das Potestades, Deus de toda a criação e de toda família dos Justos, que vivem em Tua presença. Eu Te bendigo por me teres julgado digno de ser contado no número de Teus mártires e de participar do cálice de Teu Cristo para a ressurreição da alma e do corpo na vida eterna, e na incorruptibilidade do Espírito Santo. Possa eu hoje, com eles, ser aceite em Tua presença, como oblação preciosa e agradável: Tu me preparaste para ela, Tu ma revelaste, guardaste Tua promessa, Deus de fidelidade e de verdade. Por esta graça e por tudo, eu Te louvo, Te bendigo, Te glorifico por meio de Jesus Cristo, Teu Filho Bem-Amado, eterno Sumo Sacerdote nos Céus. Por Ele, que está contigo e com o Espírito Santo, Te seja dada toda a glória, agora e pelos séculos vindouros. Amém”.

Eusébio de Cesaréia trazia no Chronicon a pessoa de Inácio de Antioquia como sucessor dos apóstolos que eram Bispos, então Inácio era Bispo tanto quanto os apóstolos. Tomei outro exemplar em mãos, conhecido por Adversus Haereses de Irineu, Bispo de Lião. Nele encontrei a lista dos Papas desde o primeiro. Para meu assombro total um nome da lsita era exatamente daquele que ouviu de Cristo: “Tu és Pedra, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja”.

“Os bem-aventurados apóstolos [Pedro e Paulo] que fundaram e edificaram a igreja transmitiram o governo episcopal a Lino, aquele Lino que Paulo lembra na epístola a Timóteo. Lino teve como sucessor Anacleto. Depois dele, em terceiro lugar, depois dos apóstolos, coube o episcopado a Clemente, que tinha visto os próprios apóstolos e estivera em relação com eles, que ainda guardava viva em seus ouvidos a pregação deles e diante dos olhos a tradição. E não era o único, porque nos seus dias viviam ainda muitos que foram instruídos pelos apóstolos. No pontificado de Clemente surgiram divergências graves entre os irmãos de Corinto. Então a igreja de Roma enviou aos coríntios uma carta importantíssima para reuni-los na paz, reavivar-lhes a fé, e reconfirmar a tradição que há pouco tempo tinha recebido dos apóstolos, isto é, a fé num único Deus todo-poderoso, que fez o céu e a terra, plasmou o homem e provocou o dilúvio, chamou Abraão, fez sair o povo do Egito, conversou com Moisés, deu a economia da Lei, enviou os profetas, preparou o fogo para o diabo e os seus anjos. Todos os que o quiserem podem aprender desta carta que este Deus é anunciado pelas igrejas como o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo e conhecer a tradição apostólica da igreja, porque mais antiga do que aqueles que agora pregam erradamente outro Deus superior ao Demiurgo e Criador de tudo o que existe.

A este Clemente sucedeu Evaristo; a Evaristo, Alexandre; em seguida, sexto depois dos apóstolos foi Sisto; depois dele, Telésforo, que fechou a vida com gloriosíssimo martírio; em seguida Higino; depois Pio; depois dele, Aniceto. A Aniceto sucedeu Sótero e presentemente, Eleutério, em décimo segundo lugar na sucessão apostólica, detém o pontificado. Com esta ordem e sucessão chegou até nós, na Igreja, a tradição apostólica e a pregação da verdade. Esta é a demonstração mais plena de que é uma e idêntica a fé vivificante que, fielmente, foi conservada e transmitida, na Igreja, desde os apóstolos até agora.”

Os testemunhos dos séculos I, II e início do século III eram claros como a luz daquele sábado onde conheci um jovem cheio de certeza. O protestantismo escondeu de mim a verdade; o professor estava certo em sua afirmação: A tradição apostólica fundamenta o catolicismo e não o protestantismo. Seria contraditório para os reformadores pregarem evidências que contestavam suas pretensões”. Como uma luz que nunca tinha observado por minha cegueira, a verdade se manifestava defronte meus olhos: a tradição apostólica, a sucessão dos apóstolos, o episcopado, a Igreja Católica, os Papas, a fé dos seguidores de Cristo, a autoridade da Igreja, o testemunho da fé desde o início da pregação do Pentecostes. Estava tomada de um sentimento que era o mesmo tempo de exaltação e repulsa. Feliz pela Igreja Católica, mas cheia da sensação de ter sido enganada por uma mentira contada reiteradamente. Faltava finalmente a Bíblia de Gutenberg; tomei a decisão de que se nela encontrasse os deuterocânicos ali mesmo eu abjuraria a fé protestante e me tornaria o que sempre combati: uma católica romana!

Naquele exemplar antigo, estavam Tobias, Judite, Baruc, Eclesiástico, Sabedoria, I Macabeus e II Macabeus, e os elementos gregos de Ester e Daniel que foram categoricamente retirados pelos reformadores. Trento não manipulou os textos sagrados, mas os manteve tais como eram desde os tempos apostólicos. Senti o desejo ardente de acreditar em tudo que eles criam. Chorei com dor mortal, pedi perdão por ter perseguido aquela Igreja que era única e santa. Os quinhentos anos de protestantismo caíram diante de mim, eram falhos e sem sentido. Meu palacete construído sobre a areia movediça teria que ser reconstruído em rocha firme. Aqueles homens viveram e morreram pela fé, portanto, eu não podia fugir como cristã do caminho que eles assumiram com tanto convicção e notoriedade. Naquela biblioteca em Lisboa, tirando de minhas costas e do meu coração definitivamente a dúvida, eu afirmei: Creio da Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica e na fé dos Papas.

Escrevi assim que pude para aquele homem que me conduziu para a fé verdadeira. Contei sobre minha dor e minhas lágrimas; falei sobre o impacto em mim causado e que me tornaria católica, romana e papista. Recebi uma carta como resposta, onde encontrei um escapulário e um canto espiritual de Santo Agostinho: “Tarde te amei, Ó beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei. Tu estavas dentro de mim e eu estava de fora e te buscava aqui, atirando-me, disforme, sobre estas formas de beleza que são criaturas Tuas”. No fim da carta, o filho de Deus que me possibilitou encontrar a Igreja de Cristo assinava: “a menor das criaturas que já pisou sobre a terra”.

Foi assim que conheci a verdade; dela dou testemunho!

*Carlos Eduardo (Carolus), caso leia as supras linhas, aceite cada palavra como presente pelos anos de vida que completará no seu aniversário que se aproxima.

Eternamente grata!

Salve Maria!

De Portugal ao Brasil, em 29 de junho de 2008.


Conheça Carlos Eduardo - O Ultrapapista


Dr. Bernard Nathanson - "Rei do Aborto"


O que pode levar um poderoso e reconhecido médico abortista a converter-se em forte defensor da vida e a abraçar os ensinamentos de Jesus Cristo?

[Neopapistas]...

Pode ser que tenha sido o peso de sua consciência pela morte de 60 mil nascituros ou talvez as muitas orações de todos aqueles que rogaram incessantemente por sua conversão...

Segundo Bernard Nathanson, o famoso "rei do aborto", sua conversão ao catolicismo seria inconcebível sem as orações que muitas pessoas elevaram a Deus pedindo por ele. "Estou totalmente convencido de que as suas preces foram escutadas por Ele", indicou emocionado Nathanson no dia em que o Arcebispo de Nova York, o falecido Cardeal O'Connor, o baptizou.

Filho de um prestigioso médico especializado em ginecologia, o Dr. Joey Nathanson, a quem o ambiente céptico e liberal da universidade tinha feito abdicar da sua fé, Nathanson cresceu num lar sem fé e sem amor, onde imperava a malicia, os conflitos e o ódio.

Profissional e pessoalmente Bernard Nathanson seguiu durante uma boa parte de sua vida os passos do seu pai. Estudou medicina na Universidade de McGill (Montreal), e em 1945 começou a namorar Ruth, uma jovem e bela judia com quem realizou planos de matrimónio. Porém, a jovem ficou grávida e quando Bernard escreveu para o seu pai consultando-o sobre a possibilidade de contrair matrimónio, este enviou-lhe cinco notas de 100 dólares e a recomendação de que escolhesse entre abortar ou ir aos Estados Unidos para casar-se, pondo em risco uma brilhante carreira como médico.

Bernard deu prioridade à sua carreira e convenceu Ruth a abortar. No entanto, o Dr. Nathanson não acompanhou Ruth è clínica e esta voltou a casa sózinha, num táxi, com uma forte hemorragia, que quase lhe custou a vida. Ao recuperar-se - quase milagrosamente - ambos terminaram sua relação. "Este foi o primeiro dos meus 75.000 encontros com o aborto, me serviu de excursão inicial ao satânico mundo do aborto", confessou o Dr. Nathanson.

Após terminar o curso, Bernard iniciou o internato num hospital judeu.

Depois passou para o Hospital de Mulheres de Nova York onde sofreu pessoalmente a violência do anti-semitismo, e entrou em contacto com o mundo do aborto clandestino. Nesta época tinha já casado com uma jovem judia, tão superficial quanto ele, e com a qual permeneceu casado cerca de quatro anos e meio.

Neste período Nathanson conheceu Larry Lader, um médico obcecado com a idéia de conseguir que a lei permitisse o aborto livre e barato. Com este objectivo, fundou em 1969 a "Liga de Ação Nacional pelo Direito ao Aborto" (NARAL), uma associação que tentava culpar a Igreja por cada morte ocorrida nos abortos clandestinos.

Mas foi em 1971 que Nathanson se envolveu diretamente com a prática de abortos. As primeiras clínicas abortistas de Nova York começavam a explorar o negócio da morte programada. Em muitos casos o pessoal das clínicas carecia de licença do Estado ou de garantias mínimas de segurança, como acontecia com a clínica dirigida pelo Dr. Harvey. As autoridades estavam a ponto de fechar esta clínica quando alguém sugeriu que Nathanson poderia encarregar-se da sua direção e funcionamento. Quando se encontrou em frente da clínica, Nathanson foi confrontado com um terrível paradoxo: a clínica dispunha de um sector de obstetricia - isto é, realizava partos normais - e, ao mesmo tempo, praticava abortos.

Nathanson realizava uma intensa actividade em prol do aborto: dava conferências, encontrava-se com políticos e governantes, pressionando-os para que fosse ampliada a lei do aborto.

"Estava muito ocupado. Quase não via a minha família. Tinha um filho de poucos anos e uma mulher, mas quase nunca estava em casa. Lamento amargamente estes anos, por mais que seja porque não assisti à infância do meu filho. Também era um segregado na profissão médica. Era conhecido como o rei do aborto", afirmou.

Durante este período, Nathandon realizou mais de 60.000 abortos, mas no fim do ano de 1972, esgotado, demitiu-se do seu cargo na clínica.

"Abortei os filhos não nascidos dos meus amigos, colegas, conhecidos e inclusive professores. Cheguei ainda a abortar meu próprio filho", chorou amargamente o médico. "Em meados da década de 60 engravidei uma mulher de quem gostava muito (...) Ela queria prosseguir com a gravidez mas ele recusou a ideia. Já que eu era um dos especialistas no tema, eu mesmo realizaria o aborto, expliquei. E assim procedi.", precisou.

Entretanto a partir deste acontecimento as coisas começaram a mudar. Deixou a clínica abortista e possou a ser chefe de obstetricia do Hospital St. Luke's. Uma nova tecnologia, o ultrasom, começava a aparecer no ambiente médico. No dia em que Nathanson pôde observar o coração do feto nos monitores eletrónicos, começou a perguntar-se "o que estamos a fazer verdadeiramente na clínica".

Decidiu reconhecer o seu erro. Na revista médica The New England Journal of Medicine, escreveu um artigo sobre sua experiência com os ultrasonografias, recohecendo que no feto existia vida humana. Incluia declarações como a seguinte: "o aborto deve ser visto como a interrupção de um processo que de outro modo teria produzido um cidadão no mundo. Negar esta realidade é o tipo mais grosseiro de evasão moral".

Aquele artigo provocou uma forte reação. Nathanson e sua família receberam mesmo ameaças de morte, porém a evidência de que não podia continuar praticando abortos impôs-se. Tinha chegado à conclusão que não havia nenhuma razão para abortar: o aborto é um crime.

Pouco tempo depois, uma nova experiência com as ultrasonografias serviu de material para um documentário que encheu o mundo de admiração e horror. Intitulava-se "The Silent Scream". foi realizado em 1984 quando Nathanson pediu a um amigo seu - que praticava entre 15 a 20 abortos por dia - que colocasse um aparelho de ultrasom sobre a mãe, gravando a intervenção.

"Assim o fez - explica Nathanson - e, quando viu a gravação comigo, ficou tão afectado que nunca mais voltou a realizar um aborto. As gravações eram assombrosas, mesmo não sendo de grande qualidade. Selecionei a melhor e comecei a projectá-la nos meus encontros pró-vida por todo o país".

Nathanson tinha abandonado sua antiga profissão de "carniceiro humano" mas ainda estava pendente o seu caminho de volta a Deus. Uma primeira ajuda veio de seu admirado professor universitário, o psiquiatra Karl Stern.

"Transmitia uma serenidade e uma segurança indefiníveis. Nessa época não sabia que em 1943, após longos anos de meditação, leitura e estudo, tinha-se convertido ao catolicismo. Stern possuia um segredo que eu tinha buscado toda a minha vida: o segredo da paz de Cristo".

O movimento prá-vida havia-lhe proporcionado o primeiro testemunho vivo da fé e do amor de Deus. Em 1989 esteve numa ação da Operação Resgate nos arredores de uma clínica. O ambiente dos que lá se manifestavam pacificamente a favor da vida dos nascituros tinha-o comovido: estavam serenos, contentes, cantavam, rezavam... Os mesmos meios de comunicação que cobriam o evento e os policiais que vigiavam, estavam assombrados pela atitude destas pessoas. Nathanson ficou cativado "e, pela primeira vez em toda minha vida de adulto comecei a considerar seriamente a noção de Deus, um Deus que tinha permitido que eu andasse por todos os proverbiais circuitos do inferno, para ensinar-me o caminho da redenção e da misericódia através da sua graça".

"Durante dez anos passei por um período de transição. Senti que o peso dos meus abortos se fazia mais grave e persistente pois acordava todos os dia às 4 ou 5 da manhã, olhando a escuridão e esperando (mas sem rezar ainda) que se iluminasse um letreiro declarando-me inocente ante um júri invísivel", indica Nathanson.

O médico leu então "As Confissões", de Santo Agostinho, livro que qualificou como "alimento de primeira necessidade", convertendo-se no seu livro mais lido já que Santo Agostinho "falava do modo mais completo de meu tormento existencial; porém eu não tinha uma Santa Mónica que me ensinasse o caminho e estava tomado por um negro desespero que não diminuia".

Nesta situação não faltou a tentação do suicídio, mas, afortunadamente, decidiu buscar uma solução diferente. Os remédios tentados falhavam: álcool, tranquilizantes, livros de auto-estima, conselheiros, até chegar a psicanálise, onde permaneceu por 4 anos.

O espírito que animava aquela manifestação pró-vida endereçou a sua busca. Começou a conversar periódicamente com Padre John McCloskey; não lhe era fácil crer, mas permanecer no agnosticismo, levava-o a um abismo. Progressivamente descobrio-se a si mesmo acompanhado de alguém que se importava com cada um dos segundos da sua existência. "Já não estou sozinho. Meu destino foi dar voltas pelo mundo à busca deste Alguém sem o qual estou condenado, e a Quem agora me agarro desesperadamente, tentando não soltar a orla do seu manto".

Finalmente, no dia 9 de dezembro de 1996, às 7:30 de uma segunda feira, solenidade da Imaculada Conceição, na cripta da Catedral de São Patrício de Nova York, o Dr. Nathanson converteu-se em filho de Deus. Formava agora parte do Corpo Místico de Cristo, a sua Igreja. O Cardeal O 'Connor administrou-lhe os sacramentos do Baptismo, Confirmação e Eucaristia.

Um testemunho expressa assim este momento: "Esta semana experimentei com uma evidência poderosa e fresca que o Salvador que nasceu há 2.000 anos em um estábulo continua transformando o mundo. Na segunda-feira passado fui convidado para um Baptismo. (...) Observei como Nathanson caminhava até o altar. Que momento! Tal qual no primeiro século... um judeu convertido caminhando nas catacumbas para encontrar a Cristo. E sua madrinha era Joan Andrews. As ironias abundam. Joan é uma das mais destacadas e conhecidas defensoras do movimento pró-vida... A cena me queimava por dentro, porque por cima do Cardeal O 'Connor havia uma Cruz... Olhei para a Cruz e dei-me conta de que o que o Evangelho ensina é a verdade: a vitória está em Cristo".

As palavras de Bernard Nathanson no fim da cerimónia, foram curtas e dircetas. "Não posso dizer como estou agradecido nem a dívida tão impagável que tenho para com todos aqueles que rezaram por mim durante todos estes anos durante os quais me proclamava publicamente ateu. Rezaram teimosa e amorosamente por mim. Estou totalmente convencido de que suas orações foram escutadas. Conseguiram lágrimas para meus olhos".

Sangue republicano

[GdR]



O António Bastos, sempre atento à história que marcou o início da queda em terras de Jeanne d'Arc, lembra hoje a asquerosa execução de Louis XVI às mãos da república jacobina revolucionária.

A Igreja demonizou o sexo e desprezou a mulher?

Não. (clique no "Não" caso tenhas coragem!). Nesta entrevista concedida a Zenit por Manfred Hauke, sacerdote, professor de Teologia Dogmática da Faculdade de Teologia de Lugano e presidente da Sociedade Mariológica Alemã, fala-se também dos alegados 5 milhões de vítimas da 'caça às bruxas', de «matriarcado» e «patriarcado» e de feminismo radical.

A Igreja é tão misógina como sustenta Dan Brown na novela «O Código da Vinci»?

continuar a ler...

Ditadura do Proletariado




[GdR]

1º - Os comunistas estão sempre ao lado do proletariado, incondicionalmente, quer a sua causa seja justa ou injusta, haja incumprimento de lei, de dever ou de qualquer obrigação civil, porque faz parte da lógica revolucionária popular que conduza à "ditadura proletária";

2º - Os comunistas estão sempre ao lado do proletariado, é certo, mas somente daquele que sirva essa lógica. Os outros são impedidos de trabalhar;

3º - Os comunistas incentivam os sindicatos e os sindicatos reivindicam negociação, mas os comunistas nunca na história quiseram o caminho do diálogo e é por isso que a greve existe sempre. Porque mesmo que se sentem à mesa, nunca saem satisfeitos. Eles querem acabar com essa mesa, na medida em que desejam acabar com o "patronato";

4º - Os comunistas subvertem sempre os acontecimentos, imbuídos de sentimentalismo populista, considerando, neste caso, a reposição da ordem como ilegal e alegando que a alteração da paz nas relações laborais em nada influi na ordem pública. Reclamam-se assim a si, e exclusivamente a si proletários, como agentes únicos em matéria que só a eles pensam dizer respeito, por mais que violem a lei;

5º - O Partido Comunista Português devia ser, por estas e outras mil e uma razões, ilegalizado.

A conversão de Paul Claudel, Diplomata, Escritor!


A história da conversão de Paul Claudel contada na 1ªpessoa e, pela primeira vez na blogosfera, traduzida para português.

Claudel aceitara "a hipótese monista e materialista em toda a sua extensão...Acreditava que tudo estava subordinado a leis, e que este mundo era um íntimo encadeamento de causas e efeitos, que a ciência não tardaria a esclarecer plenamente". A leitura da «Vida de Jesus», de Renan, ensinara-lhe tudo o que sabia sobre Jesus.

Depois foi tocado pela "Mão de Deus".

Na mão de Deus
Paulo Claudel

Nasci a 6 de Agosto de 1868. A minha conversão realizou-se a 25 de Dezembro de 1886. Tinha, portanto, 18 anos de idade. Mas, nesta altura, já a minha personalidade estava muito desenvolvida.

Ainda que os meus antepassados, em ambos os ramos, tinham sido crentes, dando à Igreja vários sacerdotes, os meus pais eram indiferentes em matéria religiosa. E, depois de termos mudado para Paris, afastaram-se completamente da fé. A minha primeira Comunhão, anterior à mudança, tinha sido boa. Mas foi, como para a maior parte da juventude, a coroação e, ao mesmo tempo, o termo da minha prática religiosa.

A princípio fui educado, ou antes, instruído, por um professor particular; depois, em escolas laicas da província, e, finalmente, no Liceu Luís-o-Grande. Com a entrada neste estabelecimento de ensino, acabei de perder a fé, que me parecia incompatível com a pluralidade dos mundos (! ! !). A leitura da «Vida de Jesus», de Renan, forneceu-me novos pretextos para esta mudança de convicções, que, de resto, tudo quanto via à minha volta facilitava ou animava.

Recordemo-nos daqueles tristes anos à volta de 1880, quando estava em todo o apogeu a literatura naturalista. Jamais o jugo da matéria pareceu mais forte. Quem possuía um nome na arte, nas ciências ou na literatura, era descrente. Todos os pretensos homens iminentes daquele século que declinava, se distinguiram particularmente pela sua hostilidade contra a Igreja. Renan imperava. Na última distribuição de prémios a que assisti no Liceu Luís-o-Grande, ocupava ele a presidência, e creio que recebi o prémio das suas mãos. Vítor Hugo acabava de desaparecer numa auréola de glória.

Aos 18 anos, acreditava eu naquilo em que a maior parte das chamadas pessoas cultas daquela época acreditava. O forte sentimento do individual e do concreto obscurecera-se em mim. Aceitei a hipótese monista e mecanista em toda a sua extensão. Acreditava que tudo estava subordinado a leis», e que este mundo era um íntimo encadeamento de causas e efeitos, que a ciência não tardaria a esclarecer plenamente. Além disso, tudo isto me parecia cheio de tristeza e de tédio. A ideia kantiana do dever, tal como no-la expôs o sr. Burdeau, nosso professor de filosofia, nunca pude digeri-la.

Para mais, vivia sem o freio da moral e ia caindo, pouco a pouco, num estado de desespero. A morte de meu avô, cuja agonia durou meses inteiros, devida a um cancro no estômago, a que eu assisti, inspirara-me um pavor terrível, e à ideia da morte não me abandonou mais. Esquecera completamente a religião e, com respeito a ela, a minha ignorância era tão grande como a de um selvagem.

O primeiro brilho da verdade surgiu-me do encontro com os livros de um grande poeta, a quem devo eterna gratidão e que tomou parte preponderante na formação do meu pensamento: Artur Rimbaud. A leitura das «Illuminations» e, alguns meses depois, «Une saison en Enfer» é um dos acontecimentos capitais da minha vida. Estes livros rasgaram a primeira brecha no meu cárcere materialista, e deram-me uma impressão viva, quase física do sobrenatural. Mas o meu estado habitual de ansiedade e desespero continuou a ser o mesmo.

Assim se passavam as coisas com aquele pobre rapaz que, no dia 25 de Dezembro de 1886, entrava na catedral de Notre-Dame de Paris, para ali assistir ao ofício divino do Natal. Começava eu então a escrever, e tive a impressão de que poderia, com superior diletantismo, encontrar nas cerimónias católicas, um meio adequado e matéria para alguns trabalhos. Nesta disposição de espírito, apertado e empurrado pela multidão, assisti à Missa cantada, com moderada alegria. Como nada mais interessante havia a fazer, voltei de novo à tarde para assistir às Vésperas. Os meninos do coro da catedral, de roquetes brancos, e os alunos do Seminário de S. Nicolau du Chardonnet, que os auxiliavam, tinham justamente começado a cantar qualquer coisa em que mais tarde reconheci o Magnificat. Eu estava de pé no meio da multidão, junto da segunda coluna, perto da entrada para o coro, à direita, do lado da sacristia.

E ali se deu o acontecimento que domina toda a minha vida. Num momento, o meu coração sentiu-se tocado, e tive fé. Tive fé com tal intensidade de adesão, com tal exaltação de todo o meu ser, com uma convicção tão poderosa, com tal segurança, que não ficava margem para nenhuma espécie de dúvida. E, desde então, todos os livros, todos os raciocínios, todas as eventualidades de uma vida agitada não conseguiram abalar a minha fé; mais do que isso, nem sequer conseguiram tocar-lhe. Subitamente, apoderou-se de mim o sentimento fremente da inocência, da perpétua filiação divina: uma revelação inefável. Quando tento reproduzir, como faço frequentemente, o decorrer dos minutos que se seguiram a este momento excepcional, encontro sempre os seguintes elementos que, todavia, representam um único raio, uma única arma, de que a Providência divina se serviu para alcançar e abrir o coração de um pobre filho desesperado : «Que felizes são, de facto, os que crêem! E se fosse verdade?
verdade! — Deus existe ; está aqui presente ! É alguém ! É um ser tão pessoal como eu! — Ama-me ! chama por mim!» Invadiram-me as lágrimas e os soluços e o cântico tão delicado do «Adeste» aumentou ainda a minha comoção.

Doce comoção, na qual, todavia, se misturava uma sensação de terror e quase de espanto ! Porque as minhas ideias filosóficas mantinham-se intactas. Deus desprezara-as, deixando-as tal qual estavam, e eu não compreendia o que nelas deveria mudar. A religião católica continuava a surgir-me como um amontoado de anedotas disparatadas. Os seus sacerdotes e fiéis continuavam a inspirar-me a mesma antipatia, que ia até ao ódio e à náusea. O edifício das minhas opiniões e conhecimentos mantinha-se, e não via nele defeito nenhum; limitara-me, apenas, a sair dele. Tinha-me sido revelado um novo e terrível ser, com terríveis exigências para um jovem artista como eu, e não via maneira de o satisfazer com nada do que me rodeava. O estado de um homem, a quem de repente se arrancou da sua pele para o introduzir num corpo estranho, no meio de um mundo desconhecido, é a única comparação que posso encontrar para exprimir este estado de completa desordem. O que mais repugnava às minhas ideias e ao meu gosto, era o que precisamente se vinha a mostrar verdadeiro ; e, a bem ou a mal, tinha de me acomodar a isso. Ah ! Pelo menos não seria sem que eu procurasse opor a maior resistência possível.

Esta resistência durou quatro anos. Ouso afirmar que foi uma defesa heróica. E a luta foi nobre e radical. Não omiti nada. Utilizei todos os meios possíveis de resistência. Uma após outra, tive que depor as armas. Foi grande a crise da minha existência, esta agonia do pensamento, da qual Artur Rimbaud escreveu : «A luta do espírito é tão brutal como as batalhas entre os homens. Oh! noite dura! O sangue derramado arde sobre o meu rosto !» A juventude que tão facilmente abandona a fé, não sabe que tormentos custa recuperá-la. A ideia do inferno, a própria ideia da beleza, todas as alegrias que, a meu ver, teria de sacrificar para regressar à verdade, retraiam-me de tudo. Finalmente, caiu-me nas mãos uma Bíblia protestante que certa amiga alemã oferecera uma vez a minha irmã Camila. Foi na noite daquele dia memorável de Notre-Dame, depois de ter voltado para casa, ao longo das ruas molhadas pela chuva, que então me pareciam tão estranhas. Pela primeira vez, ouvi ressoar no coração a voz, tão suave, e ao mesmo tempo tão inflexível da Sagrada Escritura, que jamais se viria a extinguir. Apenas através de Renan conhecia eu a história de Jesus Cristo. E, fiando-me neste impostor, não sabia sequer que Ele se tinha proclamado o Filho de Deus. Cada palavra, cada linha, na sua majestosa simplicidade, revelava a mentira das afirmações descaradas daquele apóstata e abria-me os olhos. Como o centurião romano, reconheci verdadeiramente que Jesus é o Filho de Deus. A mim, Paulo, se dirigiu Ele, entre todos, e prometeu-me o seu amor. Mas, ao mesmo tempo, não me deixou outra alternativa além da condenação, se o não seguisse. Ah!, Eu não precisava que me explicassem o que vinha a ser o inferno; já tinha passado nele a minha «temporada»! Aquelas poucas horas tinham chegado para me demonstrar que o inferno está em qualquer parte em que não esteja Cristo. E que me importava já a mira o resto do mundo, em face deste nova e maravilhoso ser que acabava de me ser revelado?

Assim falava em mim o homem novo. Mas o velho resistia com todas as forças e não queria entregar-se a esta nova vida que na sua frente se abria. Será preciso confessar que o sentimento que mais me impedia de manifestar a minha convicção era o respeito humano? A ideia de revelar a todos a minha conversão e de dizer aos meus pais que não comeria carne às sextas-feiras; o facto de ter de me afirmar coma um dos católicos tão ridicularizados, causava-me suores frios. E, momentaneamente revoltava-me até contra a violência que me tinha sido feita. Mas sentia sobre mim uma mão firme.

Não conhecia nenhum sacerdote. Não tinha um único amigo católico.

O estudo da religião passara a ser para mim o interesse dominante. Coisa curiosa ! O despertar da alma e das qualidades poéticas deu-se em mim ao mesmo tempo, e desfez os meus preconceitos e os meus receios infantis. Por essa época, escrevi o primeiro esboço dos meus dramas : «Cabeça de oiro» e «A cidade». Embora andasse ainda afastado dos sacramentos, já tomava parte na vida da Igreja. Podia, enfim, respirar, e a vida penetrava-me por todos os poros. Os livros que mais me ajudaram, naquela época, foram, em primeiro lugar, os «Pensamentos de Pascal, obra inestimável para todos os que buscam a fé, muito embora a sua influência possa também às vezes ser perniciosa. Além disso, as «Investigações do espírito sobre os Mistérios» e as «Considerações sobre os Evangelhos», de Bossuet, bem como os seus restantes tratados filosóficos; a «Divina Comédia», de Dante; e, finalmente, as maravilhosas narrações de Catarina Emmerich. A Metafísica de Aristóteles purificou-me o espírito, e introduziu-me nos domínios da verdadeira inteligência. A «Imitação de Cristo» pertencia a uma esfera demasiado elevada para mim, e os seus dois primeiros livros pareceram-me de uma terrível dureza.

Mas o grande livro que se me abriu e no qual eu fiz os meus estudos, foi a Igreja. Louvada seja por toda a eternidade esta grande e majestosa Mãe, em cujos joelhos tudo aprendi ! Os Domingos passava-os em Notre-Dame, e, sempre que me era possível, ia também lá durante a semana. Era nessa altura tão ignorante na minha religião como o poderia ser em relação ao Budismo. E agora desenrolava-se, perante mim, o drama sagrado, com tal magnificência, que ultrapassava toda a força da minha imaginação. Ah ! Esta já não era, certamente, a linguagem mesquinha dos «devocionários». Era a poesia mais profunda e gloriosa, eram as atitudes mais sublimes que jamais tinham sido concedidas a seres humanos. Nunca me conseguia saciar por completo com o espectáculo da Santa Missa, e cada movimento do sacerdote gravava-se profundamente no meu espírito e no meu coração. A leitura do ofício de Defuntos, da liturgia do Natal, o drama da Semana Santa, o cântico celeste do «Exultet», ao lado do qual as harmonias mais inebriantes de Pindaro e Sófocles me pareciam incolores, tudo isto me sufocava de alegria, gratidão, arrependimento e adoração ! Pouco a pouco, lenta e penosamente, abriu caminho até ao meu coração o pensamento de que a arte e poesia são também coisas divinas. E o prazer da carne não é indispensável para elas, mas antes prejudicial. Como eu invejava os cristãos felizes que via comungar ! Só me atrevia, porém, a misturar-me com aqueles que, em todas as sextas-feiras da Quaresma, vinham beijar reverentemente a coroa de espinhos.

Entretanto, passavam os anos e a minha situação tornava-se insuportável. Intimamente, dirigia-me a Deus com lágrimas; e, contudo, não me atrevia a abrir a boca. E, apesar disso, as minhas objecções tornavam-se cada vez mais fracas, e mais dura a exigência de Deus. Oh! que bem conheci este momento e com que firmeza me ficou gravado na alma! Mas como é que tive coragem para lhe resistir? Três anos depois, li as obras póstumas de Baudelaire. E vi que o poeta, que eu preferia a todos os poetas franceses, tinha reencontrado a fé nos últimos anos da vida, e se havia debatido com as mesmas angústias e com os mesmos remorsos que eu. Enchi-me de coragem, e, uma tardinha, aproximei-me do confessionário de S. Medardo; minha paróquia. Os minutos que esperei pelo sacerdote foram os mais amargos da minha vida. Encontrei-me com um ancião, que me pareceu muitíssimo pouco abalado com a história, que a mim, todavia, me parecia muito interessante. Falou (para meu grande aborrecimento) nas «recordações da minha primeira e santa comunhão». Ordenou-me terminantemente que revelasse a família a minha conversão. E hoje não posso deixar de lhe dar razão. Humilhado e mal disposto, saí do «confessionário» e só lá voltei no ano seguinte. Agora, estava completamente vencido, submisso e extenuado. Ali, naquela mesma igreja de S. Medardo, encontrei um sacerdote novo, compassivo e fraternal, o P. Ménard, que me reconciliou com a Igreja. Mais tarde, conheci lá outro santo e venerando sacerdote, o P. Villaume. Tornou-se o meu director e meu querido Padre espiritual, cuja poderosa protecção, lá do céu, sinto agora continuamente. A segunda comunhão recebi-a, como a primeira, no dia de Natal, a 25 de Dezembro de 1890, em Notre-Dame.

Princess Alessandra Borghese talks about her return to Catholicism


A entrevista no Telegraph e agora também em neopapistas.blogspot.com

Citação:
"What ... do her old friends, from her pre-1999 days, think of her now in her role as arch-Catholic? 'Of course, they think I am strange. People look at me in a weird way, but others respect me. It is life. It doesn't worry me. Because the great thing when you rediscover faith is that you don't feel alone anymore. And so you are stronger.' The inference is that she felt alone before that rediscovery. 'No, its not that I felt alone, rather that, even though I had everything, something was missing.'

... I slip in a final question. When she looks back to her 'other life' in the 1990s, does she have any regrets? 'No,' she fires back immediately, 'because I haven't lost anything. I am a much freer person. Much more open to the world, so I see that time as a sort of preparation. I don't want to change what has happened. I want to change what I am living now.'